quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Salvaterra ... no Romanceiro Português ! ( 2 )






Como prometido, aqui vai mais uma versão de Salvaterra do Extremo, recolhida antes de 1948 e publicada por Jaime Lopes Dias, emérito etnólogo das Beiras e não só.
O tema deste romance, mulher fazer-se passar por homem, ainda hoje é usado no cinema, onde há vários filmes que o tratam. Mito ou realidade, também temos o caso da papisa Joana. Ainda há bem poucos anos, em Portugal, houve o caso da "Generala", mulher que se fez passar por homem e oficial do exército!






Donzela guerreira

--Mal hajas tu, mulher, mais a tua parição,
2 sete filhas que tiveste sem nenhuma ser varão!
--Calese aí, ó meu pai, não nos deite a maldição,
4 que a sua filha mais nova, ela serve de varão.
--Tens o cabelo tão grande, filha, a conhecerte vão.
6 --Dêemme cá uma tesoura, que eu o deito já ao chão.
--Tens uns olhos tão bonitos, filha, a conhecerte vão.
8 --Quando passar pela gente eu os baixarei ao chão.
--Tens uns peitos tão grandes, filha, a conhecerte vão.
10 --Eu os apertarei, meu pai, até metêlos no coração.
--Tens um passo tão curto, filha, a conhecerte vão.
12 --Quando passar pelas ruas darei passos de ganhão.
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Foi recebida em casa do filho de um capitão.
.......................................................

14 --Os olhos de Leonardo, mãe minha, a matarme vão,
o corpo será de homem, mas os olhos de mulher são.
16 --Se o queres conhecer levao a uma loja a comprar
e, se ele for mulher, às fitas se háde agarrar.
18 --Oh, que fitas tão bonitas p’ra uma dama se enfeitar!
--Oh, que espadas e adagas para um homem guerrear!
20 --Os olhos de Leonardo, mãe minha, a matarme vão,
o corpo será de homem, mas os olhos de mulher são.
22 --Se o queres conhecer trálo contigo a jantar
e, se ele for mulher, [...................................]
24 aos assentos mais baixos decerto se háde agarrar
e aos panos mais sujos se háde alimpar.
26 --Oh, que cadeiras tão baixas para um homem se assentar,
oh, que panos mais sujos para um homem se alimpar!
28 --Os olhos de Leonardo, mãe minha, a matarme vão,
o corpo será de homem, mas os olhos de mulher são.
30 --Se o queres conhecer levao contigo a nadar
e, se ele for mulher, ele se háde acobardar.
32 --Cartas me vêm do céu, cartas de muito pesar,
que tenho a minha mãe morta e meu pai está a acabar.
34 --Alto, alto, meus criados, meus cavalos a ferrar,
que jornada de três numa hora se háde andar.
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36 Sete anos andei na guerra com o filho de um capitão,
sem nunca me conhecer se era mulher ou varão!

Nota de Jaime Lopes Dias: -14 a Leonardo foi o nome que a filha, que figurou de varão, adoptou.

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