quarta-feira, 15 de junho de 2011

Noites de Junho nas Termas de Monfortinho !

Passado que foi o Santo António e enquanto não chega o São João, deixo aqui um artigo, escrito por Urbano Tavares Rodrigues, inserto no jornal “ Notícias” de Lourenço Marques, de 22/07/1964


NOITES DE JUNHO NAS TERMAS DE MONFORTINHO

A água azul da noite filtra estas estrelas familiares, e tão distantes!, a lua, quase amarela, anuncia mais uma trovoada para amanhã; adolescentes, que soltaram as tranças, pulam a fogueira de São João; e a grafonola manhosa, que às vezes repete incansavelmente uma só palavra perdida, fez voltear dez pares no terreiro de baile improvisado, junto da estação de serviço. A noite cheira a flores, a essas flores brancas, suaves, adocicadas, do Parque da Fonte Santa. Nos fins do mês de Junho, diminui o afluxo de aquistas às Termas de Monfortinho. E, contudo, a avaliar por este ano não deve haver melhor época para banhos e repouso, com tempo sereno e morno, que uma ou outra trovoada breve não deixa aquecer em demasia: os montados fronteiriços, quietamente dramáticos, os trigais de um louro torrado, os visos rochosos e os fundos verdes da mata que conferem às Termas a sua dignidade, recortam-se na mais pura atmosfera que se possa imaginar, rival das terras secas do leste mediterrânico reportadas pela sua claridade imarcescível.
Até a voz da Amália, esta noite, aqui chega. Algures, numa vivenda de persianas já cerradas ou numa das muitas pensões onde a luz continua a palpitar, magicamente essa voz, envolta em febre, nasce, brusca, fonte de tristeza exaltante, corre pela noite tépida, e fere: “Ao menos ouves o vento” “Ao menos ouves o mar!”.
As raparigas dançam, mesmo umas com as outras, à falta de varões, embora daqui não tenham seguido muitos para o Ultramar. O estridor dos “paso-dobles”, vindo do lado de lá da fronteira, cornetim de bilhetes postais de há vinte anos, abafa o lamento que a grande trágica do fado arranca deste poema tão belo do David Mourão-Ferreira.
A iluminação das Termas de Monfortinho, que se vê de muitas léguas em redor, recompõe as casas, as árvores, que ficam poalhadas de ouro, matéria escultórica de um luxo fugadíssimo, embebido de noite, desta mesma noite plena de grilos, de ralos, de gritos de pássaros, da respiração olente da terra, do chiar do saibro sob os passos...Se há obra que nesta região se impõe, por ser não só de utilidade local, mas de evidente interesse nacional, é a ligação por estrada das Termas de Monfortinho com Penha Garcia, que aqui daria acesso aos viajantes do Norte desejosos de conhecerem e fruirem as belezas e os benefícios deste oásis vivente pousado entre montanhas, nos páramos, tão gratos a um olhar de artista, desta Beira Alentejana que culmina nos barrocais de Salvaterra do Extremo. Já, anos atrás, bati nesta tecla, e não me parece demais insistir, até porque, uma vez resolvido (o que não deveria tardar muito) o problema da ligação rodoviária com Cória e da consequente ponte internacional, que há-de aqui construir-se sobre o Erges segundo toda a lógica, os turistas vindos de Espanha, que hoje deploram a falta de uma via directa para o Norte e Nordeste, sem a perda de tempo da deslocação a Castelo Branco, seriam então em número cada vez maior. Além de que as instalações hoteleiras das Termas de Monfortinho, simplesmente consideradas até como ponto de paragem, pedem meças a quantas cidades!
Se a hora é de atenção ao turismo no domínio económico, não há dúvida de que esta terra privilegiada pela natureza, que a dotou, ademais da beleza, com águas que tantos males suavizam e curam (os hepáticos que o digam e os reumáticos, os nefríticos e, entre outros pobres de Cristo ou ricos pobres pelas maleitas, os que padecem de dermatoses e alergoses), estas Termas de excepcional encanto e virtude merecem, de facto, a melhor das atenções, para que depressa se convertam no centro internacional que nos parece ser o seu próximo destino.

1 comentário:

  1. Joâo , belo texto que culmina com o nosso já "quase " eterno problema...muitas auto-estradas ...mas tudo longe de nós . A eterna espera pelo dito IC31...Até quando..
    Muntas vesitas
    Quina

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