Após a comemoração, em Portugal, do Dia Mundial
da Criança, resolvi colocar este “post”, preparado há algum tempo.
 |
E aqui está a janelinha que se diz ter sido onde estava
instalada a Roda dos Expostos, em Salvaterra do Extremo |
Os expostos, no século XIX (1820-1920)
O termo “exposto” aparece no séc. XVI sendo a “Roda”, oficializada, uma
criação do séc. XVIII.
Os expostos, filhos de mães solteiras ou fruto dalguma relação extra
conjugal de mulher casada, eram crianças abandonadas, normalmente recém
nascidas, deixadas em encruzilhadas, portas de moinhos, capelas, igrejas,
soleira da porta de um casal sem filhos, da porta dalgum lavrador abastado ou
remediado ou até do próprio pai, e que, mais tarde (séc. XVIII), começaram a
ser deixadas na Roda. Em regra podiam ser expostas na própria freguesia mas nem
sempre isso acontecia, como a prudência recomendava, havendo até o caso de
pessoas que vinham da vizinha Espanha. Normalmente, o exposto, era deixado com
roupas e um bilhete indicando o nome e se já se encontrava baptizado. As
roupas, se as levava, seriam, 4 casacos, 4 camisas, 4 cueiros, 4 carapuças, 4
corpetes, 6 baetas e o lenço onde iam embrulhadas. A Roda entregava-os a uma
ama que para isso recebia uma subvenção. Coisa pouca, como sempre e mal dava
para a alimentação e cuidados. Assim, os expostos raramente ultrapassavam o ano
de vida e muito poucos os 5 anos e, mesmo esses, eram muito débeis de saúde.
No Concelho de Idanha-a-Nova, na década de 1820 a 1829, são referenciados
14 expostos e na de 1880 a 1889 há 405 (em Salvaterra do Extremo, os expostos
representam 1,3% do total da população)! No ano de 1921, último ano
referenciado, há apenas 2. A partir daqui deixou de haver Livro dos Expostos
mas continuou o abandono das crianças! No séc. XIX, os filhos eram enjeitados
por vários motivos, tais como uniões clandestinas, a suma pobreza dos pais ou
pela perversidade destes.
A razão dos expostos deve-se principalmente a que a miséria e a falta de
trabalho, fora dos meses da ceifa e debulha era grande e “as pessoas tinham de
sujeitar-se”! Assim, as mulheres e moças do povo, não estavam livres das
vontades dos senhores das terras, filhos segundos, feitores, lavradores
abastados ou padres. Eram, pois, estes os pais dos filhos da miséria. Alguns
assumiam, como padrinhos, e não eram só os padres como diz a quadra maliciosa:
Não há fruta como o medronho,
nem lenha como a de azinho,
nem filhos como os do padre,
que chamam ao pai, padrinho.
Sabe-se, por exemplo, que na segunda metade do séc. XIX, em Monsanto, o
padrinho mais conhecido era o feitor da casa do Visconde da Graciosa. Em
Idanha-a-Velha era o maior proprietário, António Pádua Marrocos e na Zebreira,
era o Regedor!
Não deve haver muitas dúvidas quando, hoje em dia, algumas humildes pessoas
do povo ostentam nomes declaradamente de nobre e abastada família! São, decerto, o fruto dessa sujeição!
Bibliografia:
António Maria Romeiro Carvalho, in Medicina na Beira Interior da Pré-História até ao Séc. XX, Cadernos de Cultura, vol. 8, Out.1994