Aqui venho, trazer mais uma versão de Salvaterra do Extremo, recolhida e publicada por Jaime Lopes Dias e, agora, inserta no ROMANCEIRO PORTUGUÊS DA TRADIÇÃO ORAL MODERNA, vol. II, editado pela Fundação Calouste Gulbenkian.
Espero que seja do agrado de quem o ler!
Espero que seja do agrado de quem o ler!
Mala suegra
[ Veneno de Moriana ]
Estando a dona Alina na sua sala real,
2 com as dores do seu parto, que se deixava finar,
desejava por parteira sua mãe de natural.
4 --Anda, vai, ó minha filha, que eu te mando a levar,
por criados e criadas que te vão a acompanhar.
6 --Quando vier D. Diogo quem lhe há-de pôr de jantar?
--Quando vier D. Diogo, eu lhe porei de jantar.
8 A caça que ele trouxer eu ta mandarei a levar,
coelhos a um a um, perdizes a par a par.--
10 Dona Alina que abalou, D. Diogo a chegar.
--Anda cá, ó meu filho, que te quero pôr de jantar.
12 --Não procuro por jantar, tão-pouco por merendar,
procuro por Dona Alina que não vejo aqui estar.
14 --Dona Alina abalou para as cartilhas do mar.
Desejava por parteira sua mãe de natural.
16 Anda vai, ó meu bom filho, anda vai-a a matar,
que as palavras que aqui
disse nem são para se contar,
18 ela a mim me chamou p… e a ti ladrão final.
--Alto, alto, meus criados, meus cavalos a ferrar,
20 com ferraduras de bronze para a jornada aturar,
que jornada de oito dias numa hora se há-de andar!--
22 Lá para o meio do caminho um criado encontraria.
--Aqui lhe trago, D.
Diogo, cartas de muita alegria,
24 que já lá tem um infante da primeira infantaria.
--Não se me dá do infante, nem da mãe que o p…,
26 vai dizer a dona Alina que lhe vou tirar a vida.
--Aqui lhe trago, dona
Alina, cartas de muita agonia,
28 que lá vem o D. Diogo que lhe vem a tirar a vida.
--Deixa falar, minha
filha, que isso há-de ser mentira!
30 --Cale-se lá, minha mãe, mais do que verdade seria
que a p… da minha sogra muito mal lhe meteria.--
32 Estando nessas razões, D. Diogo à porta batia.
--Levanta-te, ó dona Alina se te queres alevantar,
34 olha que se lá vou dentro p’las tranças te hei-de arrastar.
--Cala-te lá, meu bom
genro, que eu te mando a calar,
36 está parida de três dias não se pode alevantar.
--Dê cá o meu vestido, ajude-me a apertar
38 dê-me cá os meus sapatos ajude-mos a calçar,
dê-me cá o meu menino também o quero levar.
40 Fique-se com Deus, minha mãe, até dia de Juízo,
ele há-de ir p’ró Inferno e eu hei-de ir p’ró Paraíso.--
42 --Olha para trás, D. Diogo, olha se queres olhar,
olha as florinhas do campo todas por mim a chorar.
44 Olha para trás, D. Diogo, olha se queres olhar,
um menino de três dias olha, por Deus a falar
46 --Mal haja a minha avó, mais o leite que mamou,
a morte da minha mãe minha avó é que a causou.
48 --Cala-te lá meu bom filho, que eu te mando a calar,
a morte da tua mãe ‘inda a vais tu a levar.--
50 Um menino de três dias é um milagre falar.
--Olha para trás, D.
Diogo, olha se queres olhar,
52 o cavalo era branco e já vai do meu sinal.
--Não se me dá do cavalo que eu outro irei comprar,
54 dá-se-me do teu corpinho que sem ele vou ficar.
Fica-te com Deus, dona
Alina, neste belo areal,
56 vou chamar um confessor que te venha a confessar.
--Não me enterres, D.
Diogo, neste belo areal,
58 enterra-me naquela ermida que além está a branquejar.
--Pois aí, nesse areal, aí mesmo te hei-de enterrar,
60 co’as patas do meu cavalo a cova te hei-de acalcar.
--Toma lá o meu menino, ajuda-o a criar,
62 não o dês à tua mãe que ela mo vai a matar,
Dá-o antes à minha que é capaz de mo estimar.
64 Não passes à porta de Viana que ela te vai a matar.
--Pois à porta de Viana aí mesmo irei passar.
66 --Dá-me cá, D. Diogo, o teu menino a beijar.
Toma lá, ó D. Diogo do meu
vinho a provar.
68 --Que
me deste, ó Viana, que me deste tu no vinho?
Tenho as arrédeas na mão
já não vejo o cavalinho!
70 Que
me deste, ó Viana, que me deste a
provar?
--Três folhinhas de veneno
outras três de resgalgar!
72 A
morte da minha mana, tu ma havias de
pagar.--
Nota do editor de
Romanceiro Português TOM 2001: Omitimos as seguintes didascálias: entre -3 e -4, -6 e -7, -13
e -14, e -34 e -35 a Sogra; entre -5 e -6, -29 e -30, -36 e -37, -50 e -51, -56
e -57, e -60 e -61 Dona Alina; entre -11 e -12, -18 e -19, -24 e -25, -32 e
-33, -47 e -48, -52 e -53, -58 e -59, -64 e -65, e -67 e -68 D. Diogo; entre -22 e -23 e -26 e -27 O criado; entre
-28 e -29 A mãe; entre -45 e -46 O
menino; entre -65 e -66, e -70 e -71 Viana.
(Nota do autor do blogue: os versos 67-71 correspondem a Veneno de Moriana, ainda que o último verso faça pensar em Brancaflor e Filomena.)
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